Acaba nesta segunda-feira
(27) o prazo legal para que as 417 prefeituras baianas publiquem, na internet,
tudo que gastam e que recebem, em tempo real, além de contratos e convênios. A
Lei Complementar 131, de 2009, obriga a criação dos portais de transparência,
para que a população saiba como está sendo usado o dinheiro público, mas na
Bahia ela não pegou.
Pela lei, os municípios com
menos de 50 mil habitantes têm até amanhã para abrir as contas. Mas, desde
2011, as cidades com maior população já deveriam colocar no ar os sites de
transparência. Na Bahia, das 49 prefeituras nesta situação, 30 possuem links
para sites de transparência em suas páginas oficiais na internet, mas o serviço
não existe ou não atende a lei. Nas outras 19, apesar das informações contábeis
como as receitas e despesas estarem atualizadas, os sistemas foram feitos para
não funcionar.
Para os municípios que
descumprirem a lei, a punição é contra os cofres da prefeitura, que ficaria
impedida de receber recursos do governo federal via convênios e de contrair
empréstimos. No entanto, o órgão responsável pela fiscalização, o Tribunal de
Contas dos Municípios (TCM) reconhece a dificuldade de fazer a lei ser
cumprida.
“Até hoje, a gente tem
dificuldade. Você cobra a mesma tecnologia da informação para o município de
São Paulo e para o carente do interior da Bahia. Por exemplo, tem que ter banda
larga boa e uma série de outros itens”, avalia o coordenador de Assistência aos
Municípios do TCM, Antônio Dourado.
Manobra - Dourado explica
que, no trâmite para obter verbas de convênios federais, a Secretaria do
Tesouro Nacional requisita à prefeitura uma autorização expedida pelo TCM. É na
elaboração deste documento que é verificado se o site de transparência existe e
está funcionando. “O problema é que você vê sites que, em tese, cumprem a lei,
mas apenas jogam os dados contábeis numa linguagem técnica que ninguém vai
entender bulhufas”, afirma. Há casos de simples publicação de documentos em
papel digitalizados.
Segundo ele, em casos como
este e na ausência de portais, a autorização não é liberada.
A punição, entretanto, não
acontece. Mesmo com a recomendação contrária, os municípios conseguiram captar
recursos. Foi o caso de Ilhéus, que recebeu R$ 82 mil em fevereiro deste ano do
Ministério da Cultura para a construção de centros culturais, em convênio
firmado ano passado, quando a cidade já deveria cumprir as regras da
transparência. O Tesouro Nacional, por meio de assessoria, assegura que não
permite o repasse para prefeituras que não receberam pareceres favoráveis do
TCM.
Fora de padrão -
Aparentemente feitos para dificultar a fiscalização, quase que a totalidade dos
portais de transparência baianos não disponibiliza as informações como os
gastos e receitas por secretaria. Não há, também, preços unitários dos produtos
e serviços, o que permitiria apurar se há superfaturamento.
“As prefeituras cumprem a
legislação, mas precariamente. Não dá para saber quanto foi gasto na área de
transporte, com gasolina, listar os fornecedores, nada”, constata o consultor
em contas públicas, fundador e secretário-geral da ONG Contas Abertas, Gil
Castelo Branco.
Ele salienta que em
municípios menores, a vigilância da sociedade seria mais efetiva com
ferramentas de transparência. “O cidadão ia poder verificar, por exemplo, se a
Secretaria de Educação comprou carne para a merenda escolar, e verificar se, de
fato, seu filho está comendo carne”, exemplificou.
Entre os critérios para
avaliar um bom site, adotados pelo Contas Abertas, está a atualização diária,
um bom detalhamento, capacidade de filtragem e pesquisa de dados, um boa
quantidade de informações antigas com ferramentas de comparação, além da
possibilidade de download.
Empresas faturam alto com
sites feitos em série - Se entrarmos nos sites das prefeituras de Araci,
Bonito, Central, Wagner, Brejões, Malhada, Iaçu, Jaguaquara, Itacaré e
Guanambi, por exemplo, o leiaute é exatamente igual. Só mudam o brasão e o nome
da cidade. O coordenador da ONG Contas Abertas, Gil Castelo Branco, explica
que, após à aprovação da lei, surgiram empresas que faturaram alto com a
transparência.
Elas desenvolvem um único
sistema e vendem para centenas de prefeituras, sem sequer modificarem o desenho
das páginas. Como a maioria das prefeituras de interior não possui equipes de
informática, elas recorrem às contratações por dispensa de licitação para
adequar-se à lei. “A partir do dia 28, 4.958 prefeituras terão que colocar
contas na internet. Será o paraíso das empresas de informática, que oferecem
portais genéricos, todos igualmente ruins, cobrando uma fortuna”, pontua Gil.
Ele cita como exemplos que
deram certo sistemas de transparência desenvolvidos pelos governos estaduais de
São Paulo, Minas Gerais, Espírito Santo e Amapá, que foram disponibilizados
gratuitamente para os municípios, com alto padrão de qualidade. “Ou o governo
da Bahia faz o mesmo, ou as cidades vão cair na mão da indústria da
informática, com grande ônus aos cofres e sem qualidade”, disse.
Em 2009, em razão da
contratação de uma dessas empresas, a Associação Transparência Municipal (ATM),
a então prefeita de São Francisco do Conde, Rilza Valentim, foi condenada pelo
Tribunal de Contas dos Municípios (TCM) a pagar R$ 20 mil de multa por ter
verificado irregularidades na contratação, por dispensa de licitação, no valor
de R$ 300 mil para a implantação de um programa de transparência. Esta mesma
empresa desenvolveu sistemas, por exemplo, para os municípios de Belmonte e
Amélia Rodrigues, no valor de R$ 20 mil e R$ 42 mil, respectivamente.